Diferente do que grande parte da população pensa, os projetos minerários instalados em várias comunidades do Brasil e do mundo não representam desenvolvimento social para as populações que vivem nessas áreas. Isso fica constatado quando se analisa os índices de pobreza e extrema pobreza. Apesar da geração de emprego que esses empreendimentos propiciam, há uma forte concentração de renda e lucros para grandes corporações.
O alerta é do professor Daniel Nogueira Silva, do curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa). Atuando nas áreas de Economia Amazônica e Economia Ambiental, Daniel pesquisa o impacto social e ambiental nesta região.
Em um artigo escrito com a estudante Larissa Alves, graduanda em Ciências Econômicas pela Unifesspa, Daniel faz um apanhado histórico sobre o peso da mineração na economia paraense refletida na participação do setor tanto na produção mineral brasileira quanto no produto interno do estado.
Leia mais:No artigo ele expõe dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), no ano de 2017, indicando que o setor mineral do Pará contribuiu com 42,4% do saldo mineral do Brasil e 77,5 no saldo comercial do Estado, o que demonstra a importância da produção nesse setor para garantir saldos positivos na balança comercial tanto para o Brasil quanto para o Pará.
O valor da produção mineral vendida, consumida ou transferida para industrialização no estado foi de mais R$ 28 bilhões, sendo a maior parte da exploração concentrada nos municípios de Parauapebas, Marabá, Canaã dos Carajás, Paragominas, Curionópolis, Itaituba, Ipixuna do Pará, Almeirin e Oriximiná.
Mas, ressalta, apesar da importância econômica, o setor mineral tem deixado muitos efeitos perversos na região. Do ponto de vista ambiental, os impactos são diversos e geram um conjunto de externalidades negativas nas regiões em que os empreendimentos minerais são inseridos. “Na prática, explorar recursos minerais não traz consigo o desenvolvimento”, resume.
“O privilégio atribuído para esses grupos econômicos e a forma violenta de implantação de muitos desses projetos também destroem muitos gêneros de vida e saberes locais. Além disso, nem sempre os impactos econômicos da exploração desses recursos geram desenvolvimento para os municípios que concentram essas reservas naturais”, diz o professor.
Segundo ele, uma parte importante dos trabalhos que analisa a produção mineral argumenta que os impactos econômicos desse setor podem ter um efeito inverso do que se espera, mesmo quando analisado em termos estritamente econômicos.
“Esse fenômeno é chamado pela literatura de ‘Maldição dos Recursos Naturais’, e se refere à situação em que países ou regiões com abundância de recursos, especialmente não renováveis como minerais e combustíveis, apresentam um menor crescimento econômico, menos democracia e piores resultados econômicos e sociais que países com menos recursos naturais”, argumenta.
Debate acadêmico
De acordo com o professor, há um grande debate acadêmico acerca das causas que levam a essa situação. Em geral, elas estão relacionadas com problemas institucionais, falta de políticas públicas de uso dos recursos, efeito enclave, instabilidade nos preços internacionais entre outros motivos.
Nos primeiros trabalhos que analisaram esse fenômeno, o foco principal eram os efeitos no crescimento econômico. Depois vieram pesquisas que passaram a considerar questões como: o agravamento das desigualdades na distribuição de renda, a piora nos níveis de pobreza e outros problemas sociais que incidiam sobre regiões que exploram recursos minerais.
“Do econômico e social para as questões políticas foi apenas um passo. Instabilidade política, elevados níveis de corrupção, má governança, atropelo aos princípios democráticos passaram também a estar associados com a abundância dos recursos naturais”, explica.
Ao se debruçar sobre os dados dos municípios paraenses que exploram recursos minerais, o professor se deparou com a Maldição dos Recursos Naturais. Segundo ele, os dados relacionados à pobreza e o desenvolvimento humano dos municípios (IDHM) paraenses que exploram recursos minerais mostram isso.
“Esses dados para os municípios paraenses que exploram recursos minerais apontam para uma realidade social e econômica de extrema vulnerabilidade. Os determinantes e condicionantes dessa condição estão relacionadas com o processo de formação histórica desses municípios e se vinculam diretamente com o processo de acumulação de capital que moldou e vem moldando o espaço na região amazônica”, argumenta o pesquisador.
Para ele, as estatísticas não são um acidente, elas têm na sua origem a dinâmica de exclusão característica das sociedades capitalistas, mas que ganham contornos ainda mais intensos, dado os processos históricos que formam o Estado do Pará e o modelo de exploração dos recursos minerais implantados na região.
Diversificar a matriz econômica seria a saída
Daniel Silva explica que os recursos minerais não são renováveis, de modo que é prciso pensar em saídas para as comunidades que estão dentro de áreas de projetos desenvolvimentistas de mineração. Para que isso ocorra, segundo ele, é preciso agir em algumas frentes. A primeira delas é arrecadar mais esses recursos e melhorar a utilização desses recursos. De acordo com ele, várias instituições de pesquisa propõem a criação de um fundo para ser investido em ações que gerem desenvolvimento, educação e saúde.
Além disso, aponta o pesquisador, é preciso e diversificar a economia. “A dependência que se dá à exploração dos recursos naturais impede que, com o decorrer do tempo, essas comunidades sobrevivam sem o recurso”, explica, dando como exemplo as minas de ferro em Serra dos Carajás, que devem esgotar sua produção em 40 anos.
Ele alerta que é necessário pensar noutras matrizes econômicas para não ocorrer no Pará o que aconteceu em outros lugares do mundo, citando como exemplo algumas regiões dos Estados Unidos, que eram produtoras de petróleo, mas quando a fonte secou, acabaram se transformando em cidades fantasmas.
“Investir em diversificar a economia é fundamental”, reafirma Daniel, alertando que isso não significa investir na verticalização dos produtos minerais porque são indústrias também dependentes da mineração. É preciso pensar noutras possibilidades.
Questionado sobre quais seriam as saídas, o pesquisador observa que o primeiro ponto é aproveitar as potencialidades específicas de cada localidade. Uma boa saída seria a agricultura familiar, que é considerado um bom instrumento para geração de renda e emprego e também é uma atividade renovável.
Marabá
Mas não é só isso. No caso de Marabá, por exemplo, que é banhada por dois rios (Tocantins e Itacaiúnas), o potencial do turismo é pouco explorado. Daniel cita o caso de Imperatriz (MA) que investiu e tem ganho excelente.
“A superação dessas contradições passa pela construção de modelos de desenvolvimento local que não priorizem apenas a lucratividade das grandes empresas mineradoras, mas que também garantam, além da redução dos impactos ambientais, uma melhor distribuição dos ganhos advindos da exploração desses recursos, de modo a reduzir a pobreza e garantir uma vida mais digna para a população desses municípios”, alinhavou. (Chagas Filho)