Há tensão e muito ruído no relacionamento entre membros da Associação Comercial e Industrial de Marabá (ACIM), desde que a Prefeitura Municipal emitiu o Decreto de Número 179 no final da manhã da última sexta-feira, 26. Logo em seguida, por volta de 15 horas, o presidente da entidade, João Tatagiba, recebeu a Imprensa local para uma coletiva, na qual posicionou-se ao lado da gestão municipal, reconhecendo a necessidade de endurecer as medidas de combate à covid-19 com o fechamento de boa parte do comércio.
Essa postura, todavia, não agradou um grupo de empresários e comerciantes que são membros da associação e não demoraram para eclodir posicionamentos divergentes em relação ao pronunciamento do presidente da entidade. O próprio Conjove (Conselho de Jovens Empresários de Marabá), ligado à ACIM, manifestou-se publicamente de forma contundente no dia seguinte, por meio de suas redes sociais, o que causou uma fissura ainda maior. Leia a postagem nas redes sociais da entidade:
“O Conselho de Jovens Empresários de Marabá (CONJOVE), diante do avanço da pandemia de covid-19, que assusta o mundo inteiro e vem tirando milhões de vidas, se solidariza, especialmente, com os familiares e amigos das 307 vítimas cuja existência foi ceifada até, ontem, dia 26, no município de Marabá.
Leia mais:Nossa solidariedade se estende também aos profissionais de saúde que no dia a dia enfrentam a batalha contra o novo coronavírus na linha de frente, vários do quais já perderam a guerra para a covid-19, deixando lacunas irreparáveis.
Porém, além das mortes de pessoas, vislumbramos também, com as últimas medidas tomadas, a morte econômica de muitos dos nossos estabelecimentos do comércio marabaense. São entre 12 e 13 mil micro e pequenas empresas que ficarão fechadas durante duros oito dias.
Isso, para quem labuta diariamente no setor, suando a camisa de sol a sol para pagar folha de funcionários, recolher tributos, quitar aluguéis, honrar duplicatas de credores e colocar em dia contas de água, luz e telefone, é um duro golpe financeiro.
Oito dias com as portas cerradas é o pior dos cenários: representa demissões, títulos em protesto, ameaças de corte de serviços essenciais e, para muitos, que no cotidiano somam cada centavo ganho para sustentar a si e às famílias de seus empregados e, finalmente, a falência. O recomeçar do zero e com dívidas a pagar.
Não somos contra as medidas de combate ao avanço da doença, mas, diariamente, temos visto em noticiários nacionais e internacionais, notícias dando conta de que em várias cidades, estados e até mesmo países, o fechamento do setor produtivo não inibe o avanço da doença.
Fica aqui o nosso protesto e o nosso apelo: é preciso rever essas decisões”.
Com a polêmica instalada, no grupo de Whatsapp “Associados da ACIM”, a postagem acirrou a discussão interna e os “prints” e áudios começaram a “vazar”. Alguns deles seriam do empresário Élcio Petri, que faz duras críticas ao posicionamento de João Tatagiba, que considera passivo diante do decreto que fecha boa parte do comércio a partir de hoje, segunda-feira, 29. Em um dos áudios enviados ao PV (número privado) do presidente da ACIM, Élcio o acusa de bloquear o grupo “Associados da ACIM” e pede, de forma irônica, que ele restaure o diálogo e permita as pessoas de se manifestarem: “Libera o grupo, vai!”.
A Reportagem do CORREIO enviou mensagem à presidente do Conjove, Kessiana Soares, para que ela avaliasse se a nota publicada tinha o condão de causar divergência na ACIM, mas ela não respondeu.
Outros empresários ouvidos pela Reportagem se posicionaram ao lado do Conjove, mas preferiram manter-se no anonimato para não causar um racha ainda maior entre os associados da ACIM.
Ouvido pela Reportagem do CORREIO na noite deste domingo, 28, o presidente da ACIM, João Tatagiba, disse que o Conjove fez um posicionamento à revelia do conhecimento da diretoria da entidade e que “aquele tipo de manifestação está equivocado. Até mesmo porque o Conjove é um apêndice da ACIM e, de forma alguma, pode se manifestar independentemente. Afirmo com toda a clareza: o Conselho cometeu um ato falho e isso será discutido internamente. Sempre tivemos bom relacionamento com o Conjove e tenho certeza que vamos contornar essa situação”.
Em relação aos áudios do empresário Élcio Petri, disse que lamentava, porque se manifestar favorável ou contrário a qualquer posição do poder público é natural e faz parte do estado democrático de direito. “O lamentável é que um cidadão que trabalha com educação e disciplina use de um grupo de WhatsApp para insuflar a insubordinação, a desobediência civil, desrespeitando a entidade que o representa e, individualmente, seu presidente. Depois, ele veio no privado, enviou várias mensagens me ofendendo com palavras de baixo calão. Eu as divulguei posteriormente. Claramente foi demonstrado que ele estava embriagado”, deduz.
Tatagiba confirmou que bloqueou o grupo de Whats da ACIM por alguns minutos, segundo alegou, “para acalmar os ânimos” e logo depois fez o desbloqueio. “Felizmente, quando retornamos, os ânimos estavam mais calmos e esse cidadão (Élcio Petri) não se manifestou mais”.
O presidente da ACIM antecipou que está agendada uma reunião para as 15 horas desta segunda-feira, 29, com alguns associados para discutir a polêmica pessoalmente, tomando cuidados com a proteção relacionada à covid-19.
Por outro lado, Tatagiba fez questão de enfatizar o trabalho que a atual diretoria vem realizando desde o ano passado, quando tomou posse, para contribuir com as medidas de prevenção contra a covid-19.
“Este ano, por exemplo, fizemos campanhas em semáforos, distribuindo máscara, conscientizamos o comércio e está em curso outra campanha de conscientização da população, com participação efetiva do Conjove. Tudo que está ao nosso alcance estamos fazendo. Quando foi divulgado o Decreto severo do governo do Estado, nós procurando o prefeito Tião Miranda, o governador Helder Barbalho, mostrando que tínhamos condições de conduzir nosso problema local de forma menos rígida. Ele se sensibilizou e aceitou, permitindo a flexibilização do decreto. Mas, infelizmente, a situação em nosso município se agravou porque nossa estrutura hospitalar não atende só Marabá, mas os municípios vizinhos também. Lamentavelmente, o prefeito tomou essa decisão para que o caos na saúde seja amenizado. É compreensível que o comércio esteja saturado desde o ano passado, com tanto fecha e abre. Mas estamos estudando outra forma. Todas as sugestões que são dadas para evitar o fechamento do comércio há controvérsias e não sabemos ainda qual, de fato, resolveria o problema”.
Por fim, ele lembrou que o Comitê Municipal de Enfrentamento à Covid-19, no qual a ACIM tem assento, conta com 13 membros e que a Associação Comercial tem apenas um voto. “É natural que a posição do comitê seja divergente da nossa”. (Ulisses Pompeu)